Mortes violentas aumentam em Goiás, diz IBGE

Pesquisa, baseada em registros de cartórios civis, mostra que Goiás teve uma variação de 15% de óbitos violentos entre 2007 e 2017. Índice nacional subiu 8,13%.

Levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), baseado em registros civis e dados de cartórios de todo o País, mostram que em uma década, entre 2007 e 2017, o número de mortes de natureza violenta em Goiás aumentou 15,3%. O índice ficou acima da média nacional para o período, que foi de 8,13%. Em números absolutos, o total subiu de 3.430 pessoas que morreram em 2007 para 3.956, no ano passado. A nova edição da pesquisa Estatísticas do Registro Civil foi divulgada esta semana.

A definição de morte violenta adotada pelo IBGE leva em consideração a causalidade gerada por algum fator externo, que não seja natural. Desta forma, entram na estatística, por exemplo, casos de homicídio, latrocínio, acidentes de trânsito, suicídio e afogamentos. Segundo o superintendente do IBGE em Goiás, Edson Roberto Vieira, em muito o índice aumentou na última década, em razão dos assassinatos e dos acidentes de trânsito. A transformação vivenciada pelo Estado, nos últimos anos, com aumento populacional e da frota de veículos acima da média nacional são alguns dos fatores citados por ele.

O comparativo e divisão dos dados de acordo com o gênero mostra que os homens representam a grande maioria das vítimas de mortes violentas. O índice estadual, apesar de um pouco maior, segue semelhante ao nacional neste caso. Em Goiás, 85,1% das pessoas que morreram em decorrência de causas externas, em 2017, foram homens e, no Brasil, 84,9%. Apesar da maioria populacional ser formada por mulheres, a pesquisa mostra que os homens estão mais expostos aos elementos causadores das mortes.

“Vejo que tem muito a ver com o aumento da violência que estamos assistindo no Brasil como um todo, com o crescente tráfico de drogas e o avanço do crime organizado. E isso tem se espalhado também pelo interior do Brasil”, expõe Edson. As duas regiões goianas, cujos dados são maiores e influenciam diretamente no crescimento do índice final, segundo ele, são a região metropolitana de Goiânia e a soma dos municípios que ficam no Entorno do Distrito Federal. Só na Grande Goiânia, 1.105 pessoas perderam a vida em decorrência de morte violenta, no ano passado (veja quadro).

A presença e articulação do crime organizado em Goiás também é citado pelo coordenador do Centro de Apoio Operacional (CAO) Criminal do Ministério Público de Goiás (MP-GO), promotor Luciano Miranda Meireles. Ele lembra que o fenômeno evidenciado por investigações recentes da Polícia Civil e do MP-GO e que envolve grupos rivais, o que reflete diretamente na disputa por espaço e territórios do tráfico, se espalhou pelo interior do Estado, principalmente por meio das unidades prisionais. A prática de batismos e aumento da quantidade de integrantes continua à todo vapor, segundo ele.

No ano passado, operações deflagradas pela Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIH) trouxeram à tona os efeitos da guerra de facções, principalmente em Goiânia. A disputa por territórios, sob orientação de líderes que estão dentro das unidades prisionais, já gerou diversas mortes na capital, com características de extrema violência. Um dos casos apurados no âmbito da primeira fase da Operação Descarrilamento, por exemplo, foi a morte de um homem de 27 anos, ocorrida em janeiro do ano passado, no Setor Carla Cristina. O veículo em que ele estava foi alvejado por cerca de 90 tiros.

Alegação

A Secretaria Estadual de Segurança Pública (SSP-GO) argumenta que todas as forças policiais têm atuado de forma permanente para reduzir o número de mortes violentas em todo o Estado. O órgão se baseia ainda em dados de pesquisas, como o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que atestou uma redução de 10% de homicídios, no comparativo entre 2017 e 2014. Além disso, na análise ano a ano, os dados da secretaria, disponíveis no site do órgão mostram uma redução de 12,53% no ano passado, em relação a 2016.

De fato, a comparação mais recente, feita ano a ano, apresenta uma redução entre 2016 e 2017. Os dados coletados nos cartórios pela pesquisa do IBGE também atestam uma redução das mortes violentas de 5,9% nos últimos dois anos, em Goiás. A variação negativa em âmbito nacional foi de 0,2%, no mesmo período. Uma coisa que vem persistindo, independente das variações para mais e para menos, é o perfil e a faixa etária das vítimas. A maioria dos registros atinge, destaca Edson, a parte masculina da população, entre 15 e 29 anos, com incidência ainda mais acentuada entre jovens de 20 e 24 anos.

Nesse caso, o superintendente lembra também dos efeitos dos acidentes de trânsito. “Os jovens são mais arrojados no trânsito e temos registros, inclusive, de muitas mortes de moto”, diz ele. Não à toa, o reflexo dessa realidade é perceptível até mesmo no valor aplicado por seguros de veículos. O mercado pratica um custo maior para o público mais jovem, que se enquadra exatamente nesta faixa etária. Reportagem publicada pelo POPULAR em maio deste ano, a partir do perfil das vítimas de acidentes fatais ocorridos no trânsito de Goiânia, em 2018, mostrou que 88,1% das pessoas que morreram eram homens e 57,6% estavam em motocicletas.

Família espera solução há um ano

O desaparecimento do rapper Kaique Liberato de Melo, de 17 anos, conhecido como MC Sabotinha, ocorrido no dia 22 de novembro do ano passado próximo à sua residência, no Setor Colinas de Homero, após uma suposta abordagem policial, é um dos casos que integra a estatística. Do sexo masculino, o caso também é um exemplo de investigação que não foi concluída.

Ele teria sido colocado em um Ford Fiesta preto, quando estava próximo de um irmão. De acordo com o irmão da vítima, Kamn Liberato, três homens armados o retiraram da casa, dizendo que eram da polícia. “Depois desse dia ninguém mais viu. Ninguém mais soube de nada”, relata o irmão.

Uma ossada encontrada na última quinta-feira, na zona rural de Aparecida de Goiânia, próximo ao município de Hidrolândia, pode ser do jovem.

O construtor civil, Jonas Melo, lamenta a morte do filho, mas após encontrarem esta ossada, ele tem a esperança de que depois de quase um ano o caso pode ter uma solução. “É muito difícil de explicar como foi que o meu filho morreu, mas a gente está perto de resolver e aguarda o resultado”.

Apesar de considerar que o caso está próximo de ter uma solução, o pai do garoto acredita que o suspeito do crime não vai cumprir uma pena severa. “Vamos esperar que a pessoa que cometeu este crime seja presa”, anseia. O pai relembra que algumas ligações anônimas já foram feitas para ele. “Alguém já me ligou dizendo que matou o meu filho, ateou fogo e deixou em um matagal”. O pai diz que já suspeita sobre a identidade de quem o teria matado, no entanto aguarda a solução.

O delegado titular da Delegacia Estadual de Investigações Criminais (Deic), Valdemir Branco explica que o caso ainda está em andamento. “Não há uma autoria definida, mas há suspeitos de quem possa ter cometido o crime”, explica o delegado. O laudo da ossada encontrada está sendo analisado pelo IML e deve ser encaminhado para a Deic na próxima semana. “É um homicídio claro”, disse o delegado.

A Polícia Militar (PM) nega abordagem na região na data do desaparecimento. (Dayrel Godinho, estagiário do convênio GJC e PUC-GO)

Promotor cita impunidade

O coordenador do Centro de Apoio Operacional (CAO) Criminal do Ministério Público de Goiás (MP-GO), Luciano Miranda Meireles, aponta a impunidade e a demora de esclarecimento de alguns crimes, o que reflete no julgamento dos casos, como fatores que também incentivam o aumento da criminalidade. A sensação de que os casos não resultam em prisão ou em punição imediata, na visão dele, é uma realidade que precisa ser solucionada.

“É perceptível que quando há demora no julgamento de crimes contra a vida e quando não há punição, isso acaba servindo, mesmo que indiretamente, como incentivo a esse tipo de crime, que atinge o bem jurídico mais valioso”, afirma. Em regiões como o Entorno do Distrito Federal, por exemplo, cujos municípios possuem índices criminais entre os maiores do Estado, ele destaca ainda a ausência de políticas públicas e investimentos. “A precariedade das polícias é um exemplo disso.

Tem cidades do Entorno, como Alexânia, que tinha mais de 500 inquéritos parados. 500 mortes que não foram averiguadas”, diz.

Fonte: O Popular

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